quarta-feira, 26 de julho de 2023

Lubrificante errado: O barato que pode sair muito caro

Artigo - Ed.351 - Abertura
Lubrificante errado: O barato que pode sair muito caro

No artigo dessa edição, o professor complementa a importância das especificações dos lubrificantes indicados pelas montadoras fabricantes e reforça a importância das normas

 

artigo por Fernando Landulfo   fotos Arquivo O Mecânico

 

Esta edição da Revista O Mecânico traz uma importante matéria que trata das consequências da utilização de lubrificantes inadequados. Sejam eles escolhidos pelo critério preço (onde também se enquadram os produtos falsificados), seja por uma indicação tecnicamente equivocada.

E todo mecânico, usuário e entusiasta sabe muito bem, da importância da correta lubrificação dos componentes mecânicos de um veículo: motor, transmissão, diferencial etc. Assim como, das graves consequências da sua respectiva falha.

Num passado não muito distante, na grande maioria das vezes, as falhas de lubrificação ocorriam principalmente devido a:

 

  1. a) Falhas mecânicas ocorridas na bomba, que faz a circulação e pressurização do lubrificante e filtro, ou mesmo nas linhas de condução (rompimento ou entupimento, quando existentes);

 

  1. b) Contaminação do lubrificante por combustível oriundo do sistema de alimentação (no caso dos motores); partículas sólidas oriundas de falta de filtragem, desgaste dos componentes, ou mesmo, excesso de uso do lubrificante e liquido de arrefecimento (água), oriundo de vazamentos em trocadores de calor.

 

  1. c) Troca do lubrificante (e do filtro) além dos prazos tecnicamente recomendados, fazendo uso dos critérios de uso normal uso severo (condições de rodagem brasileiras), sobre os períodos recomendados pelos fabricantes dos veículos.

 

No entanto, a introdução de motores mais modernos de maior desempenho, motores downsizing superalimentados (que tem folgas menores e trabalham sob altas temperaturas), correias de distribuição lubrificadas, transmissões CVT, etc., evidenciou um quarto item a essa lista que, até então, tinha uma importância menor: a utilização de lubrificante incorreto.

Mas lubrificante não é tudo igual? É claro que não!

No passado, realmente as diferenças de formulação eram bem menores. Só que os conjuntos mecânicos eram bem mais tolerantes. O que tornava possível intercambiar produtos de diferentes marcas.

Só que hoje em dia a situação e outra! Os conjuntos mecânicos são fabricados com maior precisão. Consequentemente apresentam uma maior intolerância a variação das propriedades físico-químicas dos lubrificantes. Propriedades essas que estão diretamente ligadas à formulação dos produtos.

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Uma aplicação errada, como descrito na matéria sobre lubrificantes falsificados dessa edição, geralmente é fatal. E os efeitos ocorrem em curtíssimos espaços de tempo. Mas os fabricantes de veículos divulgam isso?

Sim! Para o usuário do veículo essas informações se encontram no manual do proprietário do veículo. Já o mecânico é suprido com boletins técnicos e publicações especializadas (como a revista O Mecânico).

Via de regra são divulgados “códigos alfanuméricos de aprovação”, que complementam as especificações básicas dos lubrificantes como: classificação de viscosidade, SAE, e classificação de serviço (API, ACEA, SAE, etc.) nos produtos homologados. Isso sem falar de propriedades complementares como o Ponto de Fluxo Normalizado (PFN).

O problema é que apenas uma pequena parte dos usuários lê esse tipo de material e consequentemente a desinformação “corre solta”.  E como o mercado está repleto de “sereias” que, muitas vezes, não sabem o que estão vendendo, mas que “cantam bonito”, num “tom” que costuma ser bastante atrativo (principalmente nos dias de hoje) ao leigo desinformado: o preço baixo acaba soando agradável. Isso sem contar a desqualificação das aprovações do fabricante: “não influencia nada” e da invenção dos períodos de troca: “óleo para rodar 5.000 km, 10.000 km, etc.”.

A receita para o desastre está completa: motores “fundidos” prematuramente ou cheios de “borra” no seu interior, turbo alimentadores, variadores de fase e correia lubrificadas inutilizados muito antes do término da sua vida útil de projeto etc.

Como já disse o especialista do Sindicato Interestadual dos Lubrificantes na matéria sobre lubrificantes falsificados: NÃO EXISTE MILAGRE.

Lubrificante muito barato carece de aditivos, pois ele custa caro e os bons custam mais caro ainda. E lubrificante carente de aditivos tem propriedades instáveis ou insuficientes.  Mas que propriedades são essas? Elas são muitas.

O que torna impossível descrever todas detalhadamente em um único artigo. Logo, serão citadas apenas algumas delas. Como já é sabido, o óleo lubrificante é constituído de dois componentes básicos:

 

  1. a) Uma base oleosa que pode ter origem mineral, sintética ou uma mistura das primeiras (80%);

 

  1. b) Um pacote de aditivos (produtos químicos) que conferem ou melhoram determinadas propriedades a base (20%).

 

Uma das propriedades mais importantes de um lubrificante é sua viscosidade.

Mas o que vem a ser viscosidade?

Ao contrário do que muitos pensam, viscosidade nada tem a ver com massa específica (também conhecida como “densidade”). Viscosidade de um fluido é a medida da dificuldade que este tem para escoar. Já a “densidade” é a relação entre a massa e o volume de um fluido.

Logo, podem ser encontrados fluidos de alta densidade e baixa viscosidade. E vice-versa. Mas qual a importância da viscosidade no funcionamento e proteção dos sistemas mecânicos?

É justamente essa propriedade que define, por exemplo, se um lubrificante permanecerá ou não na folga de um mancal, proporcionando a este a tão desejada lubrificação dinâmica (flutuação do eixo).

Se a viscosidade do lubrificante é muito baixa, o mesmo escapa da folga. Agora, se ela for alta, não consegue adentrar ao interior da folga.

Em ambos os casos, a consequência é o atrito seco (destruição de mancais) e/ou o mau funcionamento de dispositivos hidráulicos. Por exemplo: tuchos hidráulicos, variadores de fase e grupos de válvulas direcionais.

É por essa razão que a escolha da viscosidade do lubrificante a ser inserido no conjunto mecânico é tão importante.

Dentro do universo automotivo, a viscosidade dos lubrificantes obedece, principalmente, a uma classificação feita segundo as normas da SAE (Society of Automotive Engineers), em função de uma medição feita em laboratório, a alta ou a baixa temperatura. Por exemplo: SAE 30, SAE 40 (monoviscoso), SAE 20W40 (multiviscoso).

E como já é sabido, o fabricante do veículo indica no manual do proprietário, juntamente com o produto da marca, a classificação da viscosidade dos produtos alternativos homologados. Especificação essa que deve ser obedecida pelos lubrificadores, Guerreiros das Oficinas e usuários.

Mas não basta um lubrificante ter a viscosidade recomendada pelo fabricante do veículo para ele ser bom o bastante para atender ao mesmo. Essa viscosidade também tem que se manter estável, com as variações de temperatura. O indicador que mede essa estabilidade se chama Indice de Viscosidade (I.V.).

De um modo geral, a viscosidade dos líquidos diminui com o aumento da temperatura. Para diminuir esse efeito e manter a mesma estável, dentro dos valores desejados, seja em altas ou baixas temperaturas, os fabricantes de lubrificante adicionam aos seus produtos aditivos aumentadores de I.V. Assim sendo, quanto maior o I.V. maior a estabilidade da viscosidade do produto.

No entanto, esses aditivos aumentam a viscosidade do produto a uma determinada temperatura, devido às mudanças das suas características de solubilidade. Os polimetacrilatos, polímeros de butileno e olefinas polimeralizadas são apontadas pelos autores como alguns dos principais exemplos aditivos desse tipo.

Além do I.V. existem outras propriedades que influenciam diretamente no desempenho e na durabilidade dos conjuntos mecânicos.

A presença e intensidade dessas propriedades, depende não só da aplicação do produto e do comportamento esperado pelo fabricante do conjunto mecânico, como da aditivação (tipo e quantidade) que o lubrificante recebe durante a sua fabricação.

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Alguns dos aditivos mais utilizados na formulação de óleos lubrificantes automotivos

 

Antioxidantes:

Os derivados de petróleo são passíveis de reação com o oxigênio (oxidação), produzindo peróxidos ou ácidos, que podem provocar corrosão. Também podem ser formados compostos de cadeia longa como borras, gomas e vernizes, que podem aumentar tremendamente a viscosidade do lubrificante, impedindo a sua penetração nas folgas e provocando entupimentos. Os aditivos antioxidantes retardam a oxidação do produto e seus efeitos.

 

Dispersantes e detergentes:

A oxidação do lubrificante provoca o aparecimento de substâncias pouco solúveis que tendem a se depositar nas superfícies com as quais têm contato. Como consequência, tem-se a diminuição da lubrificação e da dissipação de calor. O problema se torna mais grave nos motores de combustão interna, nos quais os produtos da combustão incompleta (carvão) contribuem para contaminar ainda mais o óleo.

Procura-se combater esses efeitos com compostos capazes de remover e manter em suspensão os contaminantes sólidos, borras, gomas e vernizes. Os agentes detergentes são comumente confundidos com os dispersantes. No entanto suas funções são bastante distintas.

 

Detergentes:

Agem nas regiões quentes, impedindo ou retardando a formação de depósitos. Mas não consegue remover altas concentrações de depósitos. A “limpeza” do componente deve ser feita por desmontagem. Um dos principais agentes detergentes, segundo os autores, são os sulfonatos metálicos neutros ou de elevada alcalinidade.

 

Dispersantes:

Impedem a aglomeração das moléculas e mantêm os contaminantes em suspensão. Um dos principais agentes dispersantes é o polisubutenil succinimidas de poliaminas de elevada polaridade. Decorrente da ação do aditivo, o material mantido em suspensão provoca o escurecimento do lubrificante, dando o aspecto de “sujo” e ineficiente. Este fato, aos olhos de um leigo, pode erroneamente indicar um mau desempenho do lubrificante, que, muito pelo contrário, está atuando satisfatoriamente, mantendo o motor internamente limpo, evitando a formação de borra.

 

Antiespumantes:

Os lubrificantes derivados de petróleo tendem a espumar quando submetidos à agitação. A dissolução e dispersão de ar no lubrificante podem, entre outras coisas, aumentar a sua viscosidade e provocar cavitação em bombas. Já a espuma (formada na superfície) pode provocar mau funcionamento de componentes.

Tais fatos são indesejáveis, visto que, em determinadas condições de uso, tais como nos sistemas hidráulicos e nas caixas de engrenagens, seu aparecimento poderá provocar desde uma queda no rendimento, até a falta de lubrificação, o que diminuirá em muito a sua vida útil. Os polímeros de silicone são os mais conhecidos e eficientes agentes antiespuma de aplicação geral.

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Extrema pressão:

Sabe-se que a principal função de um lubrificante é separar superfícies em movimento, reduzindo o atrito e consequentemente o desgaste e a geração de calor. Compostos que contêm enxofre, cloro e fósforo, ou combinações desses elementos (olefinas sulfurizadas, ésteres sulfurizados etc.) são agentes típicos de EP.

 

Antidesgaste:

Existem casos em que a lubrificação não pode ser mantida, o que resulta em contato direto entre as partes. Para evitar danos a essas superfícies, faz-se necessário melhorar características antidesgaste do lubrificante. Compostos de fósforo, como o dialquil ditiofosfato de zinco (mais tradicional), são utilizados como aditivo antidesgaste.

Porém, como já dito anteriormente pelos especialistas no artigo sobre lubrificantes falsificados, esses aditivos são caros. Logo, lubrificantes mais baratos (quando não falsificados), costumam ter o mínimo de aditivação necessária para passar nos testes de laboratório e obter a classificação desejada.

Quando submetidos a condições mais extremas, suas propriedades podem ser perder ou variar para fora da faixa desejada. A consequência imediata é o aparecimento de sintomas de mal funcionamento. A médio e longo prazos tem-se o desgaste prematuro dos conjuntos.

Isso sem falar nas propriedades especiais que as modernas correias lubrificadas exigem. Nesse ponto é importante lembrar que uma verificação dessas propriedades, em um produto suspeito, pode ser feita em laboratório especializado.

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Então o lubrificante da marca do veículo é o melhor?

Com certeza, sim. Esse produto é formulado sob rígidas especificações impostas pelo fabricante do veículo.

Ou seja: feito sob medida. É claro que existem outros produtos alternativos, de excelente qualidade, cuja recomendação, e número de aprovação, via de regra, acompanha a descrição do produto original, no manual do proprietário do veículo.

E tão importante quanto a especificação é a origem do produto.

Mas e os outros? Existe uma forma de melhorar as suas condições de uso?

Não existe um pronunciamento das montadoras a esse respeito. Além disso, é preciso levar em conta a relação custo-benefício: será que o custo para aditivar um lubrificante inferior não ultrapassa o do lubrificante original?

É nessa hora que entra o Guerreiro das Oficinas como consultor, orientando o seu cliente a utilizar sempre o melhor produto. Afinal de contas, o que se economiza hoje com o lubrificante pode ser gasto em dobro amanhã com intervenções corretivas.

 

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