Entrevistamos 10 proprietários de oficinas mecânicas para entender os desafios do mecânico moderno para gerir seu negócio e passar credibilidade aos clientes
texto Daniel Palermo & Patrícia Pugliese fotos Daniel Palermo e Arquivo O Mecânico
Manter um pequeno negócio no Brasil pode não ser a tarefa mais fácil. Além de toda burocracia que envolve a abertura de uma empresa no país, entram em cena outras questões que o novo empresário precisa lidar no dia a dia, como a administração da empresa, gestão dos recursos, impostos, gestão de pessoas, marketing, entre outros. No mundo das oficinas mecânicas não poderia ser diferente. Ao decidir empreender e montar a própria oficina, o mecânico precisa ir além.
Tão importante quanto a parte técnica, a gestão da oficina e o bom atendimento prestados aos clientes também se tornaram itens cruciais para a prosperidade do negócio.
Um dos grandes obstáculos encontrados pelos mecânicos são os estereótipos adquiridos pela categoria ao longo dos anos. Em algum momento da carreira, você já deve ter se deparado com olhares ou comentários maldosos de pessoas que não davam credibilidade ao trabalho do profissional.
Outro grande obstáculo para a categoria é a gestão da oficina. Ao se preocupar apenas com a parte técnica do trabalho, muitos profissionais deixam a administração de lado ou até mesmo ignoram essa parte do serviço, gerando problemas que ficam cada vez mais difíceis de resolver.
Mas a pergunta é: o que fazer para superar os estereótipos encontrados na categoria e manter a administração da oficina de forma saudável?
A Revista O Mecânico entrevistou 10 mecânicos para saber a opinião e a visão deles a respeito, e as palavras mais ouvidas foram: transparência, qualificação e gestão profissional.
Hoje, quem está no mercado e tem a visão de que a clareza na apresentação dos serviços, a postura e a ética profissional e a busca de conhecimento ajudam no posicionamento e na valorização da profissão de mecânico automotivo, já está muito à frente. São essas pessoas que ajudam a modificar a imagem estereotipada que a profissão ganhou anos atrás.
A gestão de uma empresa é complexa ao começar, mas os benefícios são muitos. E só assim é possível ter um melhor controle em situações complicadas como foi a pandemia, entender o seu valor, o seu potencial para então ser reconhecido.
Camilo Matos – Garagem 85
Camilo Matos, proprietário da Garagem 85 em Guarulhos/SP, que desde cedo percebeu a importância do trabalho bem feito, comentou que os clientes
têm uma visão distorcida da profissão de mecânico por conta da postura de alguns profissionais. Ele explica que é muito importante ter o diagnóstico correto com relação ao problema que o cliente tem no carro e para isso, estudo e ferramentas corretas são essenciais. Camilo lembra com orgulho de toda sua trajetória e que não foi fácil.
“Da mesma maneira que eu trabalhava aos 16 anos, eu continuei trabalhando. Até conseguir ter uma oficina mesmo foi um longo caminho. Não tenho vergonha de falar, trabalhei muito no sol, tomando chuva às vezes, trabalhei muito na rua. Mas eu sempre soube que um dia a gente conseguiria chegar a um patamar um pouco melhor.”, comenta.
Ele quase desistiu quando sofreu um acidente e perdeu o braço esquerdo. Chegou a jogar fora todos os seus diplomas relacionados à mecânica. Mas como dizem, o conhecimento ninguém tira da gente, ele se refez. Hoje, além de ser um profissional reconhecido no mercado por seu nicho, compartilha seus conhecimentos e experiências no meio digital e em palestras.
Camilo faz questão de destacar a importância do trabalho em equipe e como é realizado em ter sua esposa Luiza, o filho Matheus e seu auxiliar Everton
trabalhando com o mesmo propósito: atender bem, entregar um bom serviço e ter seus clientes satisfeitos.
Edson Roberto de Ávila – Mingau Automobilística
Toda profissão enfrenta problemas de imagem quando se normaliza uma prática errada. Com a mecânica automotiva não é diferente. E esse rótulo de que o mecânico é alguém sujo e enganador por muitos anos foi aceito inclusive pelos próprios profissionais.
Para Edson Roberto de Ávila, da Mingau Automobilística em Suzano/SP, que tem sua oficina há 32 anos, o mecânico profissional é o responsável por sua imagem. Para que o cliente reconheça o seu valor, ele precisa ser caprichoso em todos os aspectos. Atendimento, imagem pessoal, limpeza e organização da oficina e tudo que envolver o ofício.
Estar à frente de uma oficina que já é referência no mercado não é fácil. Foi preciso muito trabalho e dedicação. E essa experiência, Mingau faz questão de passar para frente, mesmo que seja visto como polêmico por ser tão direto nas críticas para auxiliar os mecânicos que querem construir uma boa reputação.
Ele reforça como é importante o mecânico manter sua postura e estudos para melhorar cada vez mais. “Por exemplo, eu não tenho esse tipo de problema, de uns bons anos para cá. Porque quando os clientes chegam lá, geralmente, 99% já chegam com indicações. Isso é tudo resultado de um trabalho que eu fiz no decorrer dos anos”, conta.
Edson é enfático quando fala da importância de ter ética e clareza nos serviços que presta para os clientes e respeito com seus colegas de profissão. Sua oficina trabalha baseada nesses princípios e complementa: “Não tem como ser um bom profissional se você não for uma boa pessoa. É impossível isso. Isso não existe. Isso é o que eu chamo de ética.”
Edualbert Ribeiro – Ridha Centro Automotivo
Proprietário da Ridha Centro Automotivo, localizada na cidade de São Bernardo do Campo/SP, Edualbert Ribeiro acredita que os estereótipos que os
mecânicos enfrentam no dia a dia acontecem por causa da imagem que as oficinas mecânicas adquiriram no passado, quando eram bagunçadas e administradas por profissionais sem preocupação com a parte técnica. “Antigamente, a oficina era muito bagunçada, muito desorganizada, sem estrutura técnica, os profissionais não iam atrás de treinamento e não queriam investir na parte técnica”, disse Edualbert.
Segundo ele, pequenas ações feitas no dia a dia podem mudar rapidamente a imagem do mecânico perante o cliente e passar uma credibilidade maior ao seu trabalho. “O cliente começa a perceber as diferenças logo quando chega com o carro na oficina. Ele percebe se você coloca capa de banco, se você envelopa o volante, ele vê os certificados que você tem, rede social, as coisas que você agrega ao seu trabalho, tudo”.
Para o profissional, também é importante atualizar a parte técnica, buscando novos conhecimentos em cursos, palestras e congressos, afim de prestar
um serviço com melhor e mudar a maneira como o cliente enxerga o mecânico “Temos que mudar postura, estrutura, organização e gestão, tudo tem que mudar. Antigamente era tudo bagunçado, hoje se ficar bagunçado, ficar largado, você fica para trás”, diz o proprietário da oficina que completa: “Hoje a pessoas não é apenas um mecânico, é também um empresário e gestor de oficina”.
Fernando Araújo – Motor France SP
Proprietário da oficina Motor France SP na capital paulista, Fernando Araújo acredita que a culpa dessa visão negativa que alguns clientes possuem
em relação aos mecânicos acontece por causa de profissionais que não prestam um serviço adequado e acabam, muitas vezes, lesando o cliente de alguma forma por conta da má reparação do veículo ou até mesmo um erro profissional mais grave.
Para evitar esse problema, Fernando aposta na transparência em sua relação com os clientes, deixando o dono do carro ciente de tudo o que precisa ser feito. “Primeiro que eu não faço nada sem autorização do cliente. Tudo que eu faço eu mando um orçamento por escrito via WhatsApp. E junto desse orçamento mandamos fotos de todas as peças que precisam ser substituídas e o motivo da substituição”, conta Fernando.
E essa transparência se estende até o momento em que o cliente vai retirar o carro na oficina. “Quando o cliente vem retirar o carro, as peças estão separadas para ele visualizar aquilo que ele está pagando”.
Quanto à gestão da oficina, a Motor France SP possui um grande aliado para divulgar seus serviços no dia a dia, o marketing. “No último ano, eu alavanquei minha oficina em 100% em relação a movimentação com o uso de ferramentas de marketing e internet, principalmente o Google”, comenta Fernando que completa: “Todo mundo hoje que vai procurar um serviço, seja ele qual for, ele procura no Google. Você ser bem colocado no rankeamento do Google leva clientes até você”.
Fernando Romão – Oficina Veyron
Para o proprietário da Oficina Veyron em São Paulo/SP, Fernando Romão, apesar da existência desses estereótipos que acompanham a categoria, aos poucos esse cenário vem mudando para melhor. Segundo ele, muitos clientes já desenvolveram um relacionamento de confiança com as oficinas. “Alguns clientes ainda pensam dessa maneira (falando sobre os estereótipos), mas outros já encaram a oficina como algo profissional, como um lugar para levar o carro e ficar tranquilo porque o problema será resolvido”, disse Fernando, que complementa: “Tem que ter alguém de confiança, ter alguém recomendado porque existe essa questão que é um mito e todo mito tem um fundo de verdade pois tem os bons profissionais e os maus profissionais no mercado”.
Ele afirma que ser transparente é a melhor maneira de conseguir credibilidade junto aos consumidores do serviço prestado por ele. “Eu acho que a melhor maneira de passar credibilidade é você ser transparente. Falar para o cliente quais são as possibilidades de problemas no carro, que é preciso ser feito um diagnóstico para detectar a real causa do problema do carro. A transparência é fundamental, tem que ser transparente”.
Outro fator determinante apontado por Fernando para prestar um bom serviço nas oficinas é a descentralização dos processos dentro da oficina. “Eu acredito na descentralização. Quando tudo está centralizado em você, não tem como oferecer um bom serviço. É preciso ter uma visão ampla e geral do que acontece dentro da oficina”.
Luciano Jaccoud – Oficina Allvento
“A profissão de mecânico não era uma profissão desejada pelas pessoas, elas enxergavam o mecânico apenas como um executor, alguém que não tinha estudo”. Foi com essa frase que o proprietário da oficina Allvento em Curitiba/PR, Luciano Jaccoud, exemplificou sua opinião sobre como as pessoas se apegaram a uma imagem rudimentar da mecânica de antigamente, passada de geração em geração e que até hoje persiste na mente de alguns consumidores.
Luciano afirma que é preciso mostrar o quanto a mecânica evoluiu e o quanto esse profissional é indispensável para a sociedade, quebrando o paradigma cultural de que o mecânico é apenas um executor de trabalho braçal. “Estamos em um momento de mudança louvável”, afirma Luciano que completa: “Tem engenheiros mecânicos formados que hoje atuam no reparo de automóveis, tem profissionais com 20, 30, 40 anos de experiência e que atendem adequadamente o cliente. Então vale a pena pagar a mão de obra desse cara”.
Mas para ele, ser um excelente mecânico não basta para ser dono de uma excelente oficina, é preciso também ter uma visão global sobre o negócio, buscando apoio para profissionalizar a gestão do local. “Um mecânico não precisa ser expert em finanças, regras fiscais ou RH, mas tem que ter a clareza de que isso é tão importante quanto a parte técnica”, afirma Luciano que complementa: “Você não precisa deixar de mexer em motor para cuidar das finanças, mas é preciso ter alguém para fazer isso porque é muito importante”.
Marcelo Bortolotto – Auto Mecânica Prado
Com relação à visão negativa que o cliente tem sobre a profissão de mecânico automotivo, o proprietário da Auto Mecânica Prado em São Paulo/SP,
Marcelo Bortolotto, comenta que muito se deve às gerações passadas que não tinham a postura que é adotada hoje em dia. Um outro motivo para que clientes tenham experiências ruins com algumas oficinas é a procura por serviço barato. No segundo caso o que acontece é que o cliente se preocupa muito com o preço do serviço e esquece de analisar a qualidade e a experiência do prestador do serviço, o que acaba levando-os até profissionais com pouco conhecimento. “A confiabilidade vem na estrutura do mecânico, no layout da oficina, a limpeza. Onde você começa a criar essa segurança do cliente com o mecânico”, complementa.
Lembra que durante a sua carreira ele vem construindo essa confiabilidade se dedicando aos estudos e participando de palestras, assim como fazendo visitas técnicas à fabricas. Essa busca por informações técnicas e práticas foi abrindo a cabeça para melhorar a questão de limpeza, layout e comunicação com o cliente. “Esse foi o ponto essencial”, finaliza.
Na sua oficina, a Auto Mecânica Prado, a organização e limpeza são detalhes que os clientes sempre apreciam e comentam. Isso ajuda inclusive na divulgação por meio de indicações. E para que o serviço seja completo ele sempre busca atualizações. “Eu acho que quem parar de correr atras de informação não vai conseguir trabalhar. Eu acho que o avanço da tecnologia também depende do avanço do conhecimento”.
Maurício Marcelino e Luzinete Pereira
Auto Mecânica Louricar
Maurício Marcelino, que comanda a Auto Mecânica Louricar, localizada na capital paulista, acredita que esses estereótipos existem por causa daqueles
profissionais que sempre querem tirar alguma vantagem em cima das pessoas em qualquer situação. Para lutar contra a desconfiança dos clientes, Maurício encontrou no Whatsapp uma importante ferramenta para se comunicar com seus consumidores, ser transparente com eles e tornar sua mão de obra diferenciada.
“Hoje registramos os defeitos antes e mostramos depois como ficou o reparo. Tem muito cliente que chega aqui e fala: ‘você é aquele mecânico que manda vídeo, me falaram de você’. Tem quem mostre a peça quebrada ao cliente, aqui não temos a necessidade de fazer isso porque ele já viu tudo pelo vídeo”, conta Maurício, que complementa: “a questão básica é: não queremos para o outro o que não queremos para a gente”.
A administradora da oficina, Luzinete Pereira, que cuida de toda a parte burocrática do negócio desde o ano de 2009, comenta que além de utilizar ferramentas como o marketing e comunicação para melhorar o relacionamento com os clientes, pretende implementar outras ações no dia a dia da oficina. “Estamos pensando para o ano que vem em implantar algumas outras coisas, queremos ligar para os clientes depois de uns 15 dias para saber como foi o atendimento, queremos ter um canal só para isso, para ter esse feedback”, comenta Luzinete.
Rodrigo Marinho – Gade Automotive
“Eu tive sorte. O destino me ajudou. Porque quando eu fiz meu primeiro curso de autoelétrico, tinha 15 anos muito novo em 95, eu queria arrumar um serviço de ajudante de oficina. E graças a Deus eu não consegui.”, conta Rodrigo Marinho que hoje administra sua oficina, a Gade Automotive, em São Paulo/SP.
Ele explica que por ter pouca idade se tivesse conseguido um trabalho em algum lugar que não desse valor aos cuidados no atendimento e na excelência do serviço poderia, hoje, não conseguir oferecer isso. Mas acredita que a maioria das pessoas que não trabalham corretamente é porque não tem conhecimento suficiente. “Ninguém acorda e vai para a oficina pensando ‘hoje eu vou enganar pessoas”, fala. “E que os que tem esse tipo de pensamento são poucos”.
Rodrigo alerta que é muito importante se manter atualizado e investir em equipamentos para não errar no diagnóstico – algo que é sua maior preocupação, e que está cada vez mais difícil. É preciso acompanhar o mercado para não ficar para trás.
Conta que fez questão de fazer o melhor desde o começo e que ter iniciado em uma empresa que também tinha essa visão o ajudou muito. “E essa loja prestava serviço para uma concessionária. Então com 3 meses nessa oficina eu já comecei a ir para lá e aprendi a ter responsabilidade desde e cedo e de entregar um serviço com excelência. Fiquei uns 4 anos nessa loja e abri minha Oficina sem muita experiência, principalmente na parte administrativa”.
Sandro dos Santos – Dr. American Car
Sandro dos Santos aponta a falta de cuidado com o negócio e também a carência de qualificação como as grandes vilãs que tornam a categoria cheia de
estereótipos ruins. “O profissional é culpado quando ele não se valoriza, não se capacita, não cumpre os processos legais que uma empresa precisa. Dessa forma, ele tem uma mão de obra não profissional e quando acontece algo de errado com o carro, o cliente acaba indo até as redes sociais reclamar”.
Para mitigar essa situação, Sandro adotou soluções no dia a dia para apresentar uma postura mais transparente aos seus clientes. A primeira medida adotada foi a utilização de vídeos para mostrar aos clientes o antes, durante e depois dos serviços prestados. “Hoje todo o carro que entra na oficina, do momento que ele chega até sua finalização, é filmado para ser mostrado ao cliente”, conta Sandro.
A segunda medida tomada por ele foi começar a entrar em contato com os clientes após algum tempo para saber se os reparos realizados nos veículos continuavam perfeitos. “Eu tinha na minha cabeça que só deveria atender o cliente quando ele trazia o carro para oficina, não precisava trabalhar o pós-venda para saber se os reparos continuavam perfeitos depois de um tempo. Esse foi o primeiro impacto positivo que os clientes notaram”, afirma o proprietário. As medidas surtiram efeito para a Dr. American Car, já que por conta do bom atendimento prestado, o cliente passou a ser o maior divulgador da oficina. “Hoje é o cliente que, na maioria das vezes, faz o nosso merchan”.
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