quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

Artigo: “Malho”? Aqui não! Entre nós, não há espaço para desonestidade

Mecânico que é mecânico tem orgulho da sua profissão. Uma profissão que exige um dom muito especial: o de conseguir “ouvir” e “entender” as máqui­nas. Um dom que faz parte do DNA do indivíduo. Pois é, o verdadeiro Guerrei­ro das Oficinas já dá sinais de que tem o gene “M” ativo desde os primeiros anos de vida. Gene esse que pode vir de um familiar próximo ou distante. Tanto faz, o efeito é o mesmo: uma curiosida­de insaciável, aliada a uma paixão pelos mecanismos (querer fazê-los funcionar corretamente) e uma vontade enorme de ajudar os outros. E quando essa paixão se manifesta… Não adianta contrariar e tentar desviá-lo desse caminho. Cedo ou tarde, ele estará dentro de uma ofici­na como aprendiz, funcionário ou dono (herdada, ou fruto de muito esforço e de­dicação próprios).

A profissão de mecânico é extrema­mente gratificante em todos os sentidos. Dentro de uma economia onde, até ago­ra na maioria dos casos, o custo de um veículo novo ainda é bastante superior ao da manutenção (é claro que existem exceções), sabendo iniciar corretamente o negócio e ”trabalhar direito”, o suces­so vem. Basta olhar os salões da maioria das oficinas: via de regra, lotados. Raras são as exceções.

E não é apenas o sucesso financeiro que recompensa o mecânico. O social também. A mecânica de automóveis é uma das poucas profissões que gera “re­lações sociais duradoras de elevado grau de afetividade”. Uma expressão compli­cada para denominar as boas amizades. Algo muito difícil de se encontrar nas outras profissões, onde o que predomina é o raso “coleguismo”. E mecânico tem muitas: clientes, alguns fornecedores, mas, principalmente, os colegas.

Esta profissão é uma das pouquíssi­mas onde colega ajuda colega: empres­tando (ou comprando coletivamente) ferramentas, equipamentos, manuais e peças de reposição, cedendo informa­ções técnicas, indicando clientes ou, mesmo, realizando um procedimento que o outro não sabe fazer. E na maio­ria dos casos, tudo na “broderagem” (uma mão lava a outra). Alguém já viu um grupo, núcleo ou associação de den­tistas, médicos ou advogados fazendo a mesma coisa? Pois é.

Para a grande maioria dos clientes, o mecânico tem o mesmo grau de con­fiança do médico da família – e é tratado com a mesma consideração. E o Guer­reiro das Oficinas retribui da mesma forma: atendimentos fora de hora em locais distantes, orçamentos e formas de pagamento “camaradas”, além de muitas outras coisas.

Mas quem quer seguir nessa profis­são tem que ter em mente uma coisa: a frágil “estrutura” do sucesso é sustenta­da por um tripé: dedicação (muito tra­balho duro), competência e confiança. Se apenas um desses pés falhar… Toda a estrutura cai.

Deixando de lado os comentários so­bre dedicação (pois todo mecânico sabe o quão duro é trabalhar), é preciso fazer al­gumas considerações sobre competência.

No mundo de hoje, onde a concor­rência é acirrada, a competência técnica (essencial) não é suficiente para que a oficina prospere como negócio. Afinal de contas, uma oficina é uma empresa como outra qualquer. A competência administrativa também é de suma im­portância. Ou seja, além de saber con­sertar os carros (e bem), o mecânico também precisa saber administrar. Em outras palavras:

a) Definir a fatia do mercado onde quer atuar e se focar nela;
b) Estabelecer a oficina no local mais apropriado para atender esses clientes;
c) Dimensionar, contratar e dirigir corretamente a equipe necessária para “tocar o negócio”;
d) Fazer os investimentos necessá­rios: equipar a oficina e treinar a si mes­mo e a sua equipe, adequadamente, para atender a fatia do mercado que escolheu trabalhar;
e) Estabelecer parcerias vantajosas com fornecedores;
f) Comprar bem;
g) Estocar apenas o necessário, se­guindo técnicas como a curva ABC;
h) Determinar os seu custo de operação (custos fixos e variáveis) com a ajuda de especialistas como os do SEBRAE, por exemplo;
i) Determinar os preços de venda adequados: compatíveis com a fatia do mercado escolhido, mas que cubra os custos e propiciem lucro;
j) Gerenciar bem as finanças da em­presa e da sua vida pessoal: não gastar mais do que recebe (o dinheiro da em­presa é da empresa e não pode ser gasto ou comprometido com gastos pessoais) e do que a capacidade de recebimento da empesa (investimentos impagáveis). E muitas outras coisas.

NO ENTANTO, O ASSUNTO EM FOCO NESTE ARTIGO É OUTRO: A CONFIANÇA

Diz um ditado antigo que: “conquistar a confiança de uma pessoa é difícil. Re­conquistar é quase impossível”. Logo, a confiança de uma pessoas deve ser trata­da como um tesouro.

E, no caso do mecânico, esse valor é ainda maior, pois a confiança que o cliente deposita no mesmo é a mesma que ele deposita no médico. Ou seja, quando esse cliente confia, ele indica. E indica com elogios. Pode perguntar para qualquer Guerreiro das Oficinas mais experiente: mesmo com todas as ferra­mentas de divulgação existentes hoje em dia, a mais importante ainda é a indica­ção. Além disso, esse novo cliente, geral­mente, já traz consigo 50% de confiança. Quer coisa melhor do que isso?

No entanto, é preciso tomar muito cuidado. Hoje em dia, a quebra de con­fiança de um único cliente pode ser de­sastrosa.

POR QUÊ? MUITO SIMPLES

Não muito tempo atrás, um ditado do marketing dizia que um cliente satisfeito indicava para uma pessoa. Já um insatis­feito contraindicava para dez.

Dar uma “pisada na bola” gerava pro­blema? Sim, mas não muito. Na era da chamada “comunicação boca a boca”, a notícia ruim andava mais devagar, sendo facilmente esquecida. Como consequên­cia, às vezes, diante de uma “pisada de bola”, cuja retratação e consequente re­conquista da confiança do cliente, podia gerar despesa extra mais elevada, a atitu­de, de alguns profissionais, era dar uma “escorregada”, ou mesmo, dar um “passa moleque” no reclamante. Atitude essa que podia ser seguida de comentários como:

a) “Ah, deixa pra lá! A oficina está cheia. Esse cara não vai fazer falta”;
b) “Um ‘reclamão’ a menos”;
c) “Ele pode até reclamar, mas pro­var é outra coisa”;
d) “Logo ele esquece”.

E O CASO ERA LOGO ESQUECIDO

Mas isso foi antes da internet, telefones celulares, microcâmeras e redes sociais. Hoje em dia as coisas são muito diferen­tes. Uma “pisada de bola” seguida de uma “escorregada” pode custar muito caro.

Por quê? Simples. Nos dias atuais, a notícia ruim sobre uma “pisada de bola” corre muito rápido e fica registrada per­manentemente. Ainda mais se não for devidamente retratada.

Já ouviram falar de um website cha­mado “Reclame Aqui”? Isso sem falar no Facebook e nos Fóruns de discussão. Pois é muitas pessoas, consultam essas ferramentas antes de fazer o primeiro contato.

Além do mais, obter evidências ma­teriais ficou muito fácil: filmar fotogra­far e gravar em alta resolução está ao alcance de qualquer um. Além disso, a contabilidade eletrônica e as ferramen­tas do FISCO online, permitem a che­cagem dos registros rapidamente.

E se a coisa ficar mais complicada e o caso for parar na justiça (o que não é nada difícil, dependendo do tipo e tamanho do problema), pode entrar em cena um novo personagem: o Peri­to Judicial. Um especialista, nomeado pelo juiz, que vai destrinchar o ocorri­do nos mínimos detalhes. E geralmen­te ele encontra o que veio procurar. Prejuízo e dor de cabeça dobrados ou triplicados.

Logo, nada melhor do que assumir as pisadas de bola, fazer as devidas correções e fechar o caso com chave de ouro, mantendo a confiança e fidelida­de do cliente.

MAS DE QUE TIPO DE “PISADAS DE BOLA” ESTAMOS FALANDO?

De um modo geral, os erros de procedimento e os danos causados nos veículos forma acidental. Como não envolvem má fé, na maioria dos casos, após a retratação e correção dos danos não fica qualquer sequela para o rela­cionamento com o cliente.

No entanto, existe um outro tipo de ocorrência que é muito mais grave: o “Malho”.

Chama-se “malho” a desprezível prática de, intencionalmente, cobrar por um serviço sem a realização do mesmo. E quando junto com a mão de obra também são cobrados componen­tes que não são trocados, o caso fica ainda mais grave. Desnecessário dizer tais atos de má fé podem ser enquadra­dos criminalmente.

E QUEM FAZ ISSO?

Lamentavelmente, alguns poucos que se dizem mecânicos ou empresários do ramo. Só que não são nem um e nem outro. Esses seres desprezíveis não pas­sam de “picaretas” travestidos de Guer­reiro das Oficinas, que envergonham a categoria, enquanto se vangloriam dos seus atos de esperteza. Alguns deles se atrevem a rotular de “trouxas”, não só os clientes que enganam, como os mecâni­cos que trabalham de forma honesta, en­quanto ostentam o dinheiro fácil ganho desonestamente.

A farra costuma durar algum tem­po. Mas não muito. E a razão é bastante simples.

Não existe crime perfeito. Um deta­lhe que passa desapercebido acaba de­nunciando a realização da “proeza”. Por exemplo: “malhos” pequenos que geram consequências mais graves, como uma troca de filtros e fluidos cobrada, mas não realizada, que culmina na pane ge­ral de um motor ou transmissão. Um especialista pode facilmente constatar e confirmar, com a ajuda de exames la­boratoriais, que o fluido estava vencido há muito tempo. Isso sem falar em pe­quenos detalhes que clientes desconfia­dos ou peritos judiciais podem usar para confirmar o “malho”. Daí para frente o resto é história.

Quando são pegos, os picaretas pra­ticam atuações dignas de um “Oscar”, pagando de “Madalenas arrependidas”, enquanto culpam o mercado ou a situa­ção econômica do pais. Pura “lorota”.

Felizmente, muitas dessas pessoas já deixaram o mercado. Mas ainda existem outros. Cabe ao verdadeiro Guerreiro das Oficinas lutar contra essa prática horrenda que difama uma classe traba­lhadora, responsável, honesta e orgulho­sa. Não precisamos e não queremos esse tipo de gente no nosso meio.

Por Fernando Landulfo

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