Mecânico que é mecânico tem orgulho da sua profissão. Uma profissão que exige um dom muito especial: o de conseguir “ouvir” e “entender” as máquinas. Um dom que faz parte do DNA do indivíduo. Pois é, o verdadeiro Guerreiro das Oficinas já dá sinais de que tem o gene “M” ativo desde os primeiros anos de vida. Gene esse que pode vir de um familiar próximo ou distante. Tanto faz, o efeito é o mesmo: uma curiosidade insaciável, aliada a uma paixão pelos mecanismos (querer fazê-los funcionar corretamente) e uma vontade enorme de ajudar os outros. E quando essa paixão se manifesta… Não adianta contrariar e tentar desviá-lo desse caminho. Cedo ou tarde, ele estará dentro de uma oficina como aprendiz, funcionário ou dono (herdada, ou fruto de muito esforço e dedicação próprios).
A profissão de mecânico é extremamente gratificante em todos os sentidos. Dentro de uma economia onde, até agora na maioria dos casos, o custo de um veículo novo ainda é bastante superior ao da manutenção (é claro que existem exceções), sabendo iniciar corretamente o negócio e ”trabalhar direito”, o sucesso vem. Basta olhar os salões da maioria das oficinas: via de regra, lotados. Raras são as exceções.
E não é apenas o sucesso financeiro que recompensa o mecânico. O social também. A mecânica de automóveis é uma das poucas profissões que gera “relações sociais duradoras de elevado grau de afetividade”. Uma expressão complicada para denominar as boas amizades. Algo muito difícil de se encontrar nas outras profissões, onde o que predomina é o raso “coleguismo”. E mecânico tem muitas: clientes, alguns fornecedores, mas, principalmente, os colegas.
Esta profissão é uma das pouquíssimas onde colega ajuda colega: emprestando (ou comprando coletivamente) ferramentas, equipamentos, manuais e peças de reposição, cedendo informações técnicas, indicando clientes ou, mesmo, realizando um procedimento que o outro não sabe fazer. E na maioria dos casos, tudo na “broderagem” (uma mão lava a outra). Alguém já viu um grupo, núcleo ou associação de dentistas, médicos ou advogados fazendo a mesma coisa? Pois é.
Para a grande maioria dos clientes, o mecânico tem o mesmo grau de confiança do médico da família – e é tratado com a mesma consideração. E o Guerreiro das Oficinas retribui da mesma forma: atendimentos fora de hora em locais distantes, orçamentos e formas de pagamento “camaradas”, além de muitas outras coisas.
Mas quem quer seguir nessa profissão tem que ter em mente uma coisa: a frágil “estrutura” do sucesso é sustentada por um tripé: dedicação (muito trabalho duro), competência e confiança. Se apenas um desses pés falhar… Toda a estrutura cai.
Deixando de lado os comentários sobre dedicação (pois todo mecânico sabe o quão duro é trabalhar), é preciso fazer algumas considerações sobre competência.
No mundo de hoje, onde a concorrência é acirrada, a competência técnica (essencial) não é suficiente para que a oficina prospere como negócio. Afinal de contas, uma oficina é uma empresa como outra qualquer. A competência administrativa também é de suma importância. Ou seja, além de saber consertar os carros (e bem), o mecânico também precisa saber administrar. Em outras palavras:
a) Definir a fatia do mercado onde quer atuar e se focar nela;
b) Estabelecer a oficina no local mais apropriado para atender esses clientes;
c) Dimensionar, contratar e dirigir corretamente a equipe necessária para “tocar o negócio”;
d) Fazer os investimentos necessários: equipar a oficina e treinar a si mesmo e a sua equipe, adequadamente, para atender a fatia do mercado que escolheu trabalhar;
e) Estabelecer parcerias vantajosas com fornecedores;
f) Comprar bem;
g) Estocar apenas o necessário, seguindo técnicas como a curva ABC;
h) Determinar os seu custo de operação (custos fixos e variáveis) com a ajuda de especialistas como os do SEBRAE, por exemplo;
i) Determinar os preços de venda adequados: compatíveis com a fatia do mercado escolhido, mas que cubra os custos e propiciem lucro;
j) Gerenciar bem as finanças da empresa e da sua vida pessoal: não gastar mais do que recebe (o dinheiro da empresa é da empresa e não pode ser gasto ou comprometido com gastos pessoais) e do que a capacidade de recebimento da empesa (investimentos impagáveis). E muitas outras coisas.
NO ENTANTO, O ASSUNTO EM FOCO NESTE ARTIGO É OUTRO: A CONFIANÇA
Diz um ditado antigo que: “conquistar a confiança de uma pessoa é difícil. Reconquistar é quase impossível”. Logo, a confiança de uma pessoas deve ser tratada como um tesouro.
E, no caso do mecânico, esse valor é ainda maior, pois a confiança que o cliente deposita no mesmo é a mesma que ele deposita no médico. Ou seja, quando esse cliente confia, ele indica. E indica com elogios. Pode perguntar para qualquer Guerreiro das Oficinas mais experiente: mesmo com todas as ferramentas de divulgação existentes hoje em dia, a mais importante ainda é a indicação. Além disso, esse novo cliente, geralmente, já traz consigo 50% de confiança. Quer coisa melhor do que isso?
No entanto, é preciso tomar muito cuidado. Hoje em dia, a quebra de confiança de um único cliente pode ser desastrosa.
POR QUÊ? MUITO SIMPLES
Não muito tempo atrás, um ditado do marketing dizia que um cliente satisfeito indicava para uma pessoa. Já um insatisfeito contraindicava para dez.
Dar uma “pisada na bola” gerava problema? Sim, mas não muito. Na era da chamada “comunicação boca a boca”, a notícia ruim andava mais devagar, sendo facilmente esquecida. Como consequência, às vezes, diante de uma “pisada de bola”, cuja retratação e consequente reconquista da confiança do cliente, podia gerar despesa extra mais elevada, a atitude, de alguns profissionais, era dar uma “escorregada”, ou mesmo, dar um “passa moleque” no reclamante. Atitude essa que podia ser seguida de comentários como:
a) “Ah, deixa pra lá! A oficina está cheia. Esse cara não vai fazer falta”;
b) “Um ‘reclamão’ a menos”;
c) “Ele pode até reclamar, mas provar é outra coisa”;
d) “Logo ele esquece”.
E O CASO ERA LOGO ESQUECIDO
Mas isso foi antes da internet, telefones celulares, microcâmeras e redes sociais. Hoje em dia as coisas são muito diferentes. Uma “pisada de bola” seguida de uma “escorregada” pode custar muito caro.
Por quê? Simples. Nos dias atuais, a notícia ruim sobre uma “pisada de bola” corre muito rápido e fica registrada permanentemente. Ainda mais se não for devidamente retratada.
Já ouviram falar de um website chamado “Reclame Aqui”? Isso sem falar no Facebook e nos Fóruns de discussão. Pois é muitas pessoas, consultam essas ferramentas antes de fazer o primeiro contato.
Além do mais, obter evidências materiais ficou muito fácil: filmar fotografar e gravar em alta resolução está ao alcance de qualquer um. Além disso, a contabilidade eletrônica e as ferramentas do FISCO online, permitem a checagem dos registros rapidamente.
E se a coisa ficar mais complicada e o caso for parar na justiça (o que não é nada difícil, dependendo do tipo e tamanho do problema), pode entrar em cena um novo personagem: o Perito Judicial. Um especialista, nomeado pelo juiz, que vai destrinchar o ocorrido nos mínimos detalhes. E geralmente ele encontra o que veio procurar. Prejuízo e dor de cabeça dobrados ou triplicados.
Logo, nada melhor do que assumir as pisadas de bola, fazer as devidas correções e fechar o caso com chave de ouro, mantendo a confiança e fidelidade do cliente.
MAS DE QUE TIPO DE “PISADAS DE BOLA” ESTAMOS FALANDO?
De um modo geral, os erros de procedimento e os danos causados nos veículos forma acidental. Como não envolvem má fé, na maioria dos casos, após a retratação e correção dos danos não fica qualquer sequela para o relacionamento com o cliente.
No entanto, existe um outro tipo de ocorrência que é muito mais grave: o “Malho”.
Chama-se “malho” a desprezível prática de, intencionalmente, cobrar por um serviço sem a realização do mesmo. E quando junto com a mão de obra também são cobrados componentes que não são trocados, o caso fica ainda mais grave. Desnecessário dizer tais atos de má fé podem ser enquadrados criminalmente.
E QUEM FAZ ISSO?
Lamentavelmente, alguns poucos que se dizem mecânicos ou empresários do ramo. Só que não são nem um e nem outro. Esses seres desprezíveis não passam de “picaretas” travestidos de Guerreiro das Oficinas, que envergonham a categoria, enquanto se vangloriam dos seus atos de esperteza. Alguns deles se atrevem a rotular de “trouxas”, não só os clientes que enganam, como os mecânicos que trabalham de forma honesta, enquanto ostentam o dinheiro fácil ganho desonestamente.
A farra costuma durar algum tempo. Mas não muito. E a razão é bastante simples.
Não existe crime perfeito. Um detalhe que passa desapercebido acaba denunciando a realização da “proeza”. Por exemplo: “malhos” pequenos que geram consequências mais graves, como uma troca de filtros e fluidos cobrada, mas não realizada, que culmina na pane geral de um motor ou transmissão. Um especialista pode facilmente constatar e confirmar, com a ajuda de exames laboratoriais, que o fluido estava vencido há muito tempo. Isso sem falar em pequenos detalhes que clientes desconfiados ou peritos judiciais podem usar para confirmar o “malho”. Daí para frente o resto é história.
Quando são pegos, os picaretas praticam atuações dignas de um “Oscar”, pagando de “Madalenas arrependidas”, enquanto culpam o mercado ou a situação econômica do pais. Pura “lorota”.
Felizmente, muitas dessas pessoas já deixaram o mercado. Mas ainda existem outros. Cabe ao verdadeiro Guerreiro das Oficinas lutar contra essa prática horrenda que difama uma classe trabalhadora, responsável, honesta e orgulhosa. Não precisamos e não queremos esse tipo de gente no nosso meio.
Por Fernando Landulfo
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